Excel – 4 décadas e a apatia dos programadores

Parabéns para o Excel! 40 aninhos de puro glamour, vindo da autosoma, passando pelos assistentes como o Clippy, gráficos instantâneos, tabelas dinâmicas, ribbon, script lab, etc., etc., etc… 40 anos, talvez mais velho que você, meu caro “internauta”.

Clippy, saudades, mas nem tanto
Clippy, saudades, mas nem tanto

Poucas ferramentas chegaram perto de habilitar o usuário de computador a produzir de forma tão otimizada quanto o Excel. Sim, estou falando do mercado corporativo, já que eu nem recomendaria que você pagasse uma licença de Excel só pra fazer sua lista de compras.

O Excel é [insira seu palavrão aumentativo preferido aqui] demais!

Mas… há um público específico que difere frontalmente desta perspectiva. Como faço parte deste grupo (sem compartilhar da opinião), neste texto, tomo a iniciativa de declarar o quão impopular é essa prática e como esse público poderia se beneficiar do seu uso.

Os programadores odeiam Excel

Ouso dizer que este é quase um axioma. Todo programador que conheci em quase todos os times os quais participei, expressavam um sentimento similar. Se havia exceções, elas eram sempre associadas aos que eram ou mais experientes ou próximas de analistas de negócios ou gerentes de projetos. Afinal, quem escapa de um bom relatório feito em Excel?

Passei muito tempo tentando entender o motivo da repúdia. Por um breve período, culpei o VBA. Para programadores de linguagens modernas (qualquer coisa orientada a objetos), o VBA é quase um insulto. Esse fenômeno tem explicação, que espero ficar mais claro mais tarde neste mesmo texto.

A conclusão foi a seguinte:

Excel não é para programadores (?)

Um gerente de projetos uma vez compartilhou um pensamento que fez sentido, e como bônus, ele também havia programado no passado.

Programadores têm um grande problema: eles não entendem ferramentas que não compilam.

Bem, o Excel não compila (esqueça o VBA por enquanto). Se alguma coisa não dá uma resposta positiva do tipo “sucesso”, o programador se sente perdido. Admito que esta é uma super simplificação de um problema maior, mas resume bem.

Ao abrir um Excel, o programador vê um grid, um dos controles mais poderosos e complexos na categoria interface de usuário. E isso é tudo o que eles veem. E é aqui que a oportunidade se perde. Se um analista de dados abre o Excel, ele vê um mundo de oportunidades. Uma célula é quase um universo em si se ela tiver acesso aos dados certos.

Ok, o sistema de fórmulas não é um Python (esqueça a fórmula PY por enquanto), mas se houver algo próximo de um “low-code” de sucesso, aqui está ele! E de quebra, é traduzido para uma quantidade quase obscena de idiomas, coisa que nenhuma linguagem de programação conseguiu.

Me faz pensar se o sucesso do Excel é o que incomoda, mas duvido desta premissa. Programadores são criaturas que, por dominarem certos conceitos de computação, sentem-se como os engenheiros do mundo moderno, e falam de cada programa como um mecânico fala do motor do seu carro, ou como um investidor de ações fala de como você está perdendo dinheiro na poupança, ou o nutricionista chato que diz que tudo o que você come engorda, ou o maromba da academia que diz que você está treinando errado, etc.

Acho que neste ponto o problema ficou claro.

O que o Excel consegue é ser simples para usuários não especialistas em computação, coisa que muitos programas que eles criam não conseguiram: criar um programa de sucesso.

O Excel forma programadores

Já tinha uma ideia parecida, mas tive uma epifania quando ouvi a opinião deste camarada:

Future of vibe coding | DHH and Lex Fridman (em inglês)

Este é apenas um corte e o assunto em questão é vibe coding, coisa que nem vou comentar aqui. Lá pelo minuto 2:30, ele faz uma referência ao processo de formação de um programador, mas também elucida como contadores, engenheiros, e outras profissões que processam dados conseguem através da ferramenta progredir naturalmente para a competência de produzir micro aplicativos, que é o caso do Excel.

Lembra quando falei sobre o trauma que programadores têm do Excel por causa do VBA? Pois então, é disto que estou falando. Contadores, engenheiros, advogados, analistas, todos têm acesso ao Excel e, quando rompem o limite do interesse, eles “progridem” para o VBA, criando um universo de “coisinhas” que basicamente sustentam muitos negócios. Com isso, todo tipo de microaplicação é possível, e ela não precisa de uma cara bonita, nem de um processo de distribuição complexo, o Excel já dá isso pra ela.

Esse potencial é o que a Microsoft não conseguiu substituir até hoje. Não tem PowerApps que consiga chegar perto. O usuário abre o Excel, adiciona algumas fórmulas, quando não é mais suficiente, abre o VBA e o céu é o limite. Lembre-se que o VBA pode chamar APIs do Windows diretamente.

Mas é aqui que está o pulo do gato. Se algumas das profissões citadas acima criaram um monstrinho em VBA e nunca mais voltaram para consertar, outros simplesmente se apaixonaram pelo trabalho e acabaram migrando para a profissão.

E nisto, eu me encaixo.

Saber Excel te faz um programador/profissional melhor

Para mim, tudo começou com o VBA. Admito que HTML e CSS tinham vindo um pouco antes, mas como a web ainda engatinhava, na minha rotina de analista o VBA fazia muito mais sentido já que o Excel era parte da minha rotina.

Daí, vieram as oportunidades, micro-aplicativos, gerenciadores de tudo o que possa imaginar, tudo cliente-servidor, etc., etc. Não muito mais tarde, já tinha decidido que minha carreira seria computação, software de preferência.

20 anos depois, mesmo tendo passado por papéis de liderança e arquitetura de software moderna (leia-se nuvem), o Excel me acompanha em praticamente todos os times em que trabalhei. Seja via algum tipo de extração ou manipulação de dados, relatório, ou mesmo automação, não era raro que alguns planilhas deixassem membros do time boquiabertos, por mais medianas que fossem. As situações eram muitas, de integrações com ferramentas, manipulação de arquivos, tudo. Web scraping então…

Um caso recente fez com que fosse destaque em uma das apresentações para o cliente, tudo por causa de uma UDF/macro + formatação condicional. Nas semanas seguintes, as mensagens no Teams não paravam pedindo ajuda para fazer algo parecido, mesmo um simples PROCV.

Logo depois, tarefas mais graciosas foram solicitadas, tudo porque este que vos fala podia automatizar coisas que vinham no Excel, enquanto outros membros da equipe, programadores ou não, mal passavam do autofiltro. Cheguei a ser chamado de “exército de um homem só”, ao qual respondi “bem que eu podia ser pago pelo trabalho de um exército”. (espero que meu gerente não esteja lendo isto [= )

Mas qual foi a diferença? Eu tinha em minhas mãos acesso a ferramentas muito mais poderosas, linguagens de alto nível, SQL Server, etc.

A diferença é que o Excel está aí, sempre esteve, e estará na máquina do estagiário e do CEO da empresa, e, se você for cuidadoso, seu bom trabalho vai acabar sendo visto pelo simples fato de sua solução ter sido empacotada num .xlsx.

O futuro

É verdade que boa parte das automações vem substituindo o que o Excel faria anteriormente, e por vezes ele nem entra mais na jogada. Mas o fato é que, tem muita, muita coisa para automatizar, e provavelmente haverá mais no futuro. Quando isso acontecer, o Excel estará lá para ou proporcionar ou auxiliar no processo de criação, teste e depuração da mesma.

Incluo nisto todo o barulho sendo feito pela IA, só para ficar claro.

Concluindo

Este é apenas um relato, o qual exponho de forma a você, caro leitor, tirar suas conclusões. Em meu ver, saber Excel, independentemente da sua posição no trabalho, desde que ela envolva passar boa parte do tempo na frente da tela do Windows, só te trará vantagens, se é que não vai mudar o rumo da sua carreira, como fez com a minha, e faz até hoje.

Valeu por tudo, Excel. 40 anos. Quem venham mais 101000!

O autor, que escreveu este texto sem a ajuda de nenhum GPT da vida, apesar de saber que eles o usarão para seu treinamento sem pedir permissão.

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